Felizmente há já bastante tempo que não passava por este processo e, também por isso, resolvi descrever-lho tal como o conhecia. Estava convicta que ficaria a aguardar numa qualquer sala até que alguém dissesse aquilo que queremos ouvir: "correu tudo bem!".
Depois de chegar e da burocracia tratada, fiquei a perceber que o processo agora era diferente. Foi-me explicado que, na qualidade de familiar a acompanhar, iria receber um sms quando a cirurgia tivesse início e o mesmo quando terminasse. Achei esta parte uma melhoria significativa em relação ao "antigamente". Isto não existia, o que fazia com que depois do doente entrar quem esperava ficava sempre refém de uma enfermeira ou auxiliar a quem íamos pedindo noticias para saber se já teria começado e o mesmo para saber se já teria terminado e mais uma vez para ouvir a tal frase: "Correu tudo bem!".
Chegada a nossa vez, fomos encaminhados para aquilo a que chamam sala de admissões. Uma sala ampla com várias "boxs" separadas por cortinas. Percebi, mais uma vez, o quanto as coisas eram diferentes, diria que para melhor. Segue-se um corrupio de pessoas diferentes, e com funções diferentes, a confirmar todos os dados de base para diminuir ou eliminar a possibilidade de erro. Confirmar o nome, a data de nascimento, o tipo de cirurgia, o contacto do acompanhante, etc... Também aqui percebi melhorias significativas.
Começo então a pensar naquilo que me faz hoje descrever esta história. De cada vez que alguém me voltava a explicar que iria receber vários sms ao longo do processo, eu perguntava se esse sms também mencionava o sucesso da operação. A primeira vez que pergunto questionaram-me se tinha combinado alguma coisa com o médico a esse respeito, ao que respondi que não. Nesta altura achei estranho! Continuei a fazer a mesma pergunta a quem ia aparecendo, mas, aparentemente, como nada tinha ficado definido ou combinado, ninguém sabia! Não teria deixado o tema ficar sem resposta caso se tratasse de algo mais complexo, porém, complexo ou não, mais do que um sms que nos tranquiliza percebendo que já começou ou acabou, o que queremos saber ou ouvir é, reforço, "Correu tudo bem!".
Fui recebendo os SMS tal como anunciado e definido no processo automatizado e bem. A cirurgia começou às 16:00 e pelas 19:30 o meu filho chegou ao quarto onde o esperava. Quando lhe perguntei: "Correu tudo bem!?" A resposta que me deu foi: "Acho que sim, mas eu não sou o médico!". Nessa altura percebi que também ele, o doente, não tinha tido uma voz explicita a dizer: "Correu tudo bem!".
A reflexão que deixo hoje neste artigo de opinião tem que ver com um fenómeno que vejo acontecer com mais frequência do que aquela que era desejada. As empresas procuram nos processos, nos sistemas, na inteligência artificial, a solução integral para lidar com os seus desafios e mesmo com a experiência dos seus Clientes. Investem-se, muitas vezes, uns bons milhares de euros em softwares de automatização e esquece-se o básico. Neste caso o básico de quem quer que seja que desenhou este processo tão eficiente é uma simples constatação de facto: "Correu tudo bem!".
Automatizar sim tendo em conta que não há processos eficientes se não forem eficazes na humanização.
E porque imagino que a esta altura esteja curioso: Sim, correu tudo bem!
Artigo publicado no Jornal da Madeira, edição de 19/10/2023