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Nos sapatos do Cliente: é fácil?

Já lá vão uns anos desde que me apercebi que é fácil dizer às pessoas para se porem no lugar do outro, mas esta é uma realidade que não depende só da vontade de cada um.

Em 2010, estava num workshop num grupo hoteleiro de luxo. O foco era a experiência Cliente e trabalhávamos formas de surpreender e criar experiências memoráveis. O público do workshop era multidisciplinar, incluindo participantes de diversos níveis hierárquicos. Na mesma sala tinha diretores de vendas e jardineiros a trabalhar em conjunto na promoção e uma cultura centrada no Cliente.

A dada altura, perante uma dinâmica de criação de ideias, percebi que uma das equipas dizia apenas o obvio. A equipa, casualmente, era composta por pessoas com funções mais operacionais. Perante o resultado, comecei por insistir com o grupo para pensar mais além e, de uma forma natural, disse “ponham-se no lugar do Cliente e pensem no que gostariam de ter que vos surpreendesse na chegada ao Hotel!”.

Ainda não tinha acabado a frase quando senti que tinha pedido uma coisa, para muitos, impossível! Se conseguisse traduzir esse momento num cartoon, surgiria no cimo da minha cabeça uma lâmpada ou outra coisa do género.

Como podia eu pedir a pessoas que, muito provavelmente, nunca ficaram num hotel para se colocarem no lugar do Cliente num hotel, ainda por cima de luxo!

Desde esse dia que, dificilmente utilizo esta lógica e, também por isso, passei a usar outras ferramentas no meu trabalho de consultoria, porém, no dia a dia das empresas é frequente ouvirmos isto dito às equipas e, muitas vezes, com um toque de indignação como se fosse algo simples que não percebemos porque é que as pessoas não fazem!

Há não muito tempo, este tema esteve presente quando em conversa com um diretor geral lhe explicava esta lógica. Ele insistia que não percebia a dificuldade até que lhe perguntei:

Ponha-se nos pés de um astronauta e diga-me o que gostaria de ter à chegada ao foguetão antes de ir para uma missão em Marte.

Olhou para mim, fez um breve silêncio e disse: já percebi!

Se criar uma cultura de excelência fosse fácil, teríamos muito mais empresas a conseguir esse feito.

A empatia (colocar-me no lugar do outro) é um ingrediente essencial, simplesmente não acontece apenas e só porque determinamos ou instruímos as nossas pessoas a calçar os sapatos do Cliente.

Ao reconhecer que a empatia não é um interruptor que se liga a pedido, mas sim uma competência que deve ser cultivada e alimentada, abrimos a porta para a criação de experiências memoráveis e ambientes de cultura organizacional saudável. Esta realidade não desafia apenas a noção simplista de empatia no local de trabalho, mas serve, também, como um lembrete poderoso de que a excelência em serviço exige um entendimento profundo e genuíno das diversas realidades humanas.

A busca pela excelência e pela verdadeira empatia é uma jornada contínua, repleta de aprendizagens, ajustes e, acima de tudo, humanidade.

Lembremo-nos que a era de Inteligência Artificial, em que estamos, é também a era da empatia e da Feeling Economy e á medida que esta avança vale a pena recordar que a verdadeira inovação e excelência nascem no ponto de encontro entre a tecnologia de ponta e a compreensão profunda do ser humano.

Artigo publicado no Jornal da Madeira,  edição de 04/04/2024