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Clientes habituais estão satisfeitos!

Assumir que Clientes habituais estão satisfeitos é, sem dúvida, um perigo na retenção e fidelização de Clientes e ao serviço, em geral.

É sabido que é, francamente, mais caro angariar um Cliente novo do que reter um existente, porém, muitas empresas e indivíduos continuam a investir uma grande parte do seu tempo, ou talvez a maioria, na busca de novos Clientes fazendo com que o acompanhamento a Clientes habituais fique menos eficaz, eficiente ou cuidado.

A relação que mantemos com um Cliente não é muito diferente da relação que mantemos com um amigo ou mesmo um namorado ou marido/mulher. A razão de perda de Clientes, por isso mesmo, não é muito diferente da razão de perda de uma amizade ou relacionamento amoroso.

Quando assumimos que um Cliente habitual já é fiel e não requer a mesma atenção baixamos a guarda e ficamos, por vezes, demasiado relaxados. Esse é o perigo! Por vezes eles vão lançando alguns sinais de alerta, mas nós, com a visão toldada e trazida pela antiguidade e hábito nem sempre lemos esses sinais.

Não é muito diferente falar da conhecida expressão: “À vontade não é à vontadinha!”.

Para dar cor a este tema partilho uma história passada em família ainda antes do confinamento, há cerca de 4 anos.

Tínhamos por hábito ir a um restaurante, que fazia as delícias de todos, sempre que existia um bom motivo para comemorar. Desde o início das aulas ao início ou fim de férias, qualquer motivo era bom para visitar o espaço. O ritual era simples, chamavam-nos a “família dos bifes!”. Isto porque sempre que íamos lá os 4 era para comer o chamado “Bife à XPTO” (omito o nome propositadamente). De referir que o staff deste restaurante é todo, ainda hoje, completamente, Top Service.

O dono, que normalmente viaja pelas várias mesas e vai dando dois dedos de conversa com aqueles que conhece sempre o fazia connosco. Éramos de tal forma habituais que quando ligávamos a reservar já sabiam o que íamos beber e comer fazendo com que à chegada ao restaurante já tivéssemos um sumol de laranja, um iced tea de limão e um espumante no gelo, para os adultos. Tudo isto sempre na mesma mesa.

O episódio que estragou toda a relação passou-se em 2018, depois de uns longos anos de fidelidade. No jantar estamos eu e o meu marido e o meu filho Lourenço.

Como habitualmente marcamos a mesa, chegamos e fomos acolhidos de forma calorosa por todo o staff. O dono cumprimentou-nos de forma efusiva, talvez até demais, agora olhando para trás.

Quando se aproximou da nossa mesa para os habituais 2 dedos de conversa pegou na garrafa de espumante como se nos fosse servir e brincou com o meu filho mais novo apontando a garrafa ao seu copo que estava praticamente cheio.

- Também bebe disto, não é? – brincou com o Lourenço que olhou para nós com um ar entre o riso e a dúvida.

- Não, não. Eu não! – disse tímido a e sorrir com os seus 11 anos à época.

- Não bebes? Mas tens que provar. Eu vou por, vais ver que gostas! Quando provares não queres outra coisa e com iced tea é uma maravilha! – afirmou de forma quase eufórica enquanto entornou uma quantidade significativa no copo do meu filho.

Não achamos piada à brincadeira e se nada dissemos foi pelo facto de ele o ter feito, ter saído de imediato a rir e de nós termos ficado meio sem fala!

- Já pedimos outro copo, filho – disse ao Lourenço de forma tranquila mas não alegre.

Acontece que, com a conversa, nos esquecemos de pedir outro copo e, a meio da refeição, o Lourenço, esquecido do sucedido, deitou o copo à boca quase borrifando toda a mesa com o cocktail de espumante e iced tea.

A refeição começou a ficar desconfortável. Tornava-se inevitável mostrar descontentamento. Pedimos outro copo e outro iced tea mais tarde. De notar que o primeiro estaria sensivelmente a meio.

Se este episodio só por si é suficiente para ilustrar o título deste artigo, vejamos o episódio seguinte passado no mesmo dia.

A determinada altura uma senhora que entra no restaurante bate, sem querer, no frapé que estava de pé junto à mesa, provocando um aparato enorme e, claro, derrubando balde, gelo e garrafa. O momento fez com que um dos colaboradores a apanhasse assim que tocou no chão erguendo-a quais filme de James Bond soltando um sonoro... “apanhei-te”.

- E não entornou nada! - disse olhando para nós, para o “patrão” e para toda a sala que não ficou indiferente ao sucedido.

- Isso é que são reflexos! – respondi convicta de que o tema ia ser tratado como devia ter sido.

- Não, não... acredite! – respondeu orgulhoso do seu feito.

É importante referir que não estou certa se caiu ou não espumante no chão, até porque onde a garrafa caiu também estava gelo e água, porém, que ela esteve no chão e que foi apanhada pelo gargalo, isso posso assegurar.

Pois bem, a partir daqui a nossa refeição passou-se a tentar perceber como iam lidar com mais aquele imprevisto.

Tendo em conta que não falamos de um restaurante corrente e que falamos de Clientes habituais, supostamente fiéis, qual lhe parece que seria a atitude ou decisão correta?

Pois enquanto a refeição decorria deixamos de estar descontraídos a jantar e passamos a pôr no centro da nossa conversa aquele conjunto de disparates sucessivos.

A pressa em “atestar” os copos era visível e a garrafa de espumante terminou.

- Outra? – perguntou-nos o empregado da nossa mesa;

- Não – respondemos em uníssono e sem sorriso.

- A conta por favor – anunciou o meu marido deixando transparecer pouca satisfação.

Antes de lhe anunciar o desfecho desta refeição, comentávamos entre nós que aquilo que o dono tinha feito com o Lourenço era pateta, mas talvez tivesse sido uma tentativa de ser engraçado sem sucesso. O tal “à vontadinha”, porém, estava lá.

Já o episódio da garrafa levou-nos a pensar em várias hipóteses para suavizar. Na nossa opinião deveriam, imediatamente, ter retirado aquela garrafa e sugerir abrir uma outra, mesmo que disséssemos que não, o que provavelmente seria o caso. Mas tal não aconteceu. Pensamos depois que talvez não a fossem cobrar, hipótese que não nos iria agradar ou retirar o mal-estar instalado.

Pois bem, não só nada disto foi feito como a somar a isto, foram-nos cobrados dois iced tea apesar de metade de um deles não só ter sido alvo de uma brincadeira sem piada nenhuma como ter ido para o lixo!

E à saída daquele que era o nosso favorito anunciei, que não voltaria lá.

E assim foi. 4 anos passaram sem ir aquele local onde éramos tratados pelo nome, conhecíamos todos os rostos e éramos acarinhados.

Voltamos lá este ano, não por nós mas por insistência do meu filho mais velho que não estava presente no dia desta refeição e, talvez por isso, guarde boas memórias do espaço. Essa história deixo para um outro artigo porque não só reforça o perigo de assumirmos que Clientes habituais estão satisfeitos como demonstra o perigo de um Cliente silencioso.

Não vale a pena fazer contas ao dinheiro não ganho ou perdido nestes quatro anos. Não foi só termos deixado de ir, foi também uma quantidade de pessoas que não levámos lá ou a quem não recomendamos o espaço.

Acreditar que um Cliente habitual é um dado adquirido não só é falso como perigoso. Talvez um simples e genuíno pedido de desculpas tivesse feito toda a diferença!

Votos de bom serviço!

Mais sobre este tema: De quem é a culpa?